O SER IMORTAL E AS VESTES DA MORTALIDADE
Era um sonho
comum, como a grande maioria dos sonhos que nos ocupam as noites e que em geral
são esquecidos quando a onda de preocupação diária nos envolve. Todos temos
preocupações diárias, este talvez seja o maior véu a nos afastar dos grande mistérios
da vida, possivelmente de forma proposital, como em uma razão mística
evolutiva, foram colocados obstáculos para nos afiar a atenção e nos exercitar
a vontade de evoluir como seres. A vida nos envolve, casca de mortalidade por
sobre um centro imortal, breve inspiração por entre infinitas expirações, esta
vida é capaz de nos inebriar de tal forma que nos faz experimentá-la como se
infinita fosse, mesmo na certeza inequívoca de que não é. Foi neste sonho comum
e místico, como é a binariedade de todas as coisas, que me veio esta lembrança,
que de fato não pode ser esquecida, que não pode ser obliterada pela beleza de
estar aqui.
Estava em uma
jornada neste sonhar, uma metáfora inconsciente talvez de nossa vida. Nesta
jornada eu buscava os mistérios, era como um Indiana dos filmes antigos, eu
queria entender o que nos cerca, pois sabendo da cerca saberia dos limites
internos e externos e a amplitude do que espreitar. Percebam que o mistério não
está no que temos dentro ou fora dos limites, das cercas, dos muros, mas sim no
limite, no muro, na cerca em si. Conhecer o limite, como ele foi edificado, quem
o construiu e quem o mantém é o grande mistério. Sendo assim, em nossa vida,
mistério maior seria talvez tudo que fosse limítrofe: o nascimento, a morte, o
despertar, o sonhar, a noite, o dia – nos extremos de cada um, nos limites
impostos para nós todos está o grande mistério de tudo.
Mas o sonhar
que me escapa por entre devaneios é o que eu quero contar, ele é o limite. Não
que ali tenha sido dito nada de novo, nenhum grande mistério, nenhuma grande
revelação. Se é o que esperam de mim aqui, ou em qualquer outro lugar, de
antemão já evito-lhes uma decepção, não sou um profeta ou guru, tão pouco um
vidente extraordinário que lhes dará uma chave mágica para a transcendência, tudo
que lhes falo aqui são questões um tanto quanto ordinárias, tecidas com uma
linha um tanto quanto usual por um tecelão não tão habilidoso. Faço com o
coração, faço com a sinceridade de quem quer descobrir e que a cada dia entende
que as descobertas não são efeitos de artes mágicas complexas ou fórmulas
herméticas escondidas em visões extraordinárias, mas sim um olhar desprendido
de expectativas para o comum, o ordinário, o cotidiano que muitas vezes,
abafado pela monotonia das rotinas deixa-se escoar por nossas mãos, embaçar-se
pelas vista, emudecer-se pelos ouvidos. Para quê maior mágica que o canto de um
pássaro, o mistério da complexidade de uma pessoa interagindo conosco, a
impressionante estrutura complexa do céu azul do dia ou negro da noite, as
construções humanas, a produção de um texto ou o ressoar das cordas vocais de
uma palavra? Para quê mistério maior que nossa vida, de um conjunto de carne e
ossos e água jorrando e materializando-se em seres individualmente únicos,
capazes de contestar a própria existência? Para quê mistério maior que este que
nos faz tocar o sentimento uns dos outros com palavras, manipular sensações,
alterar realidades, criar e destruir vidas? Vivemos imersos em um mistério infindo
manifesto buscando um inexistente mistério latente – tudo brota na simplicidade
do cotidiano...
E o sonhar,
poderiam me perguntar. Talvez tenha sido apenas um mero engodo para despejar
palavras e filosofias vãs em uma manhã de um dia comum, e nada seria mais
simbólico do que falar de coisas comuns em um dia comum, questionando-se sempre
da existência de dias especiais. Mas tivemos um sonho sim, talvez de somenos
importância ele só serviu para me lembrar. Estes sonhares, um dos tantos
limites, uma das tantas cercas que de tão baixa não nos impede de explorar um
vasto campo que a cerca. Este sonhar me permitiu tal conversa. Nele
encontrei-me com uma energia especial, ela me questionava sobre o caminhar e
estes limites, e me fazia, com uma sabedoria que não possuo agora mas que tinha
naqueles limites do sonhar, explicar a ele a composição do corpo energético,
para além da carne, tripas e ossos que parecemos. Naquela mesa especial, para
aquela pessoa especial (tão especial quanto todos nós que lemos agora, e os que
nunca irão ler este texto), expliquei que somos duas coisas neste conglomerado
de luz – o ser mortal envolvendo o ser imortal.
O ser mortal é
a camada, é o limite, aquele que separa e dá o contorno. Quem dá a aparência a
um objeto é o seu limite. Veja um copo de água, a forma que a água tem é dada
graças ao receptáculo que a guarda, e todos sabemos o que acontece quando o
receptáculo se quebra. Agora imaginemos uma garrafa de água lacrada, cheia de
água, dentro de um mar infindo de água – somos nós no universo. A fina camada
desta garrafa nos identifica, separando-nos daquele mesmo conteúdo que nos
cerca, fazendo-nos crer diferentes de tudo aquilo que nos cerca. O foco nesta
garrafa faz com que esqueçamos do conteúdo, e assim, quando este invólucro se
quebrar quebrar-se-á toda a consciência que depositamos apenas ali, sendo que o
interior será mais uma gota em meio ao oceano, inconsciente de si.
O ser imortal é
o conteúdo, o limitado pelo ser mortal neste breve casamento que se chama vida.
Limita-se o imortal para que ele ganhe a consciência de uma individualidade,
para quando for liberto do mortal possa diferenciar-se do mar de onde veio e
seguir a sua jornada para algo que não me meto e nem pretendo compreender ainda
– compreender o mortal é o suficiente, e fazer essa compreensão iluminar o
imortal é a meta para esta breve jornada.
Este ser
imortal que reside dentro de cada um de nós é a meta que precisa ser alcançada
no que tange à consciência. Quando estava eu sonhando estava eu com este ser
imortal em sua atuação, quando ele não sabe ser eu, indivíduo, e não está
consciente, mas apenas como espectro a passear por entre imagens, eu estou a
perder o jogo de consciência. Aqui e agora, grande parte de nós está
consciente, ou deveria estar. Sabemos ser, estar e temos a sensação de
continuidade linear (de onde viemos, temos uma história pessoal, etc). Em um
sonhar perdemos esta sensação exatamente pelo descontrole do ser imortal, pela
falta de consciência que damos a este aspecto importantíssimo de nossas vidas.
Morrer é como o sonhar – se você entrar consciente terá uma jornada como de um
sonhar, um sonho controlado - , se você
entrar inconsciente, será sugado por memórias de sua vida, traços, imagens
desconexas com lampejos de consciência, até ser consumido em suas próprias
memórias totalmente até o retorno ao nada, ao tudo.
No sonhar eu
conseguia voltar com uma fagulha de consciência, que eu via como um feixe de
luz em meu interior, a compreender que eu era o sonhado, lembrei onde estava
dormindo e vi que eu estava com o ser imortal, livre e trouxe minha consciência
até o sonhar. Explicando isso a aquele arquétipo energético no sonho vi mais
uma vez a morte em minhas explicações. Via o ser mortal se quebrando, impactado
pela força rolante, e o vendo assim despedaçado percebia que a vida não é a carne,
o osso as tripas, está era apenas a roupa que vestia o ser imortal. Contudo,
aquele ser de brilho intenso ao perder as roupas, inconsciente de si começava a
se dissipar, filamentos se soltavam e ele ia sendo consumido por uma força que
o sugava pedaço a pedaço até consumi-lo. As memórias ainda o mantinha em alguns
pedaços, que aos poucos iam perdendo o brilho próprio e sendo esfacelados pela
força incompreensível que a tudo reivindica no final – a tudo que é inconsciente,
cabe frisar.
O que percebi,
após a profusão de visões que tive, é que sobra da pessoa comum, após morrer,
apenas um fragmento de luz, geralmente onde estava fixada a sua consciência no
ser imortal pela sua vida cotidiana, aquele lugar chamado ponto de aglutinação.
Aquilo ali vira um emaranhado de memórias que vai sendo consumido pouco a pouco
e permite uma sobrevida em um tipo de espírito para a pessoa por algum tempo,
mas que não permite ao ser entender-se como um ser ainda, é como um sonho
confuso para o que morreu, uma profusão de visões que a medida que são vividas
são consumidas, como um novelo de lã que se desenrola e vai sendo consumido por
um fogo.
Este aspecto
que ainda sobrevive é o aspecto captado por médiuns, que ainda conseguem
comunicar-se entrando no “sonho de morte” destas pessoas. Alguns destes
resquícios de energia se manifestam como espíritos, visões, assombrações. Tudo
resquícios do filme da vida, das questões internas, memórias, confusões pessoas
de quem viveu e inconsciente morreu. Para a grande maioria das pessoas a morte
é tão consciente como foi os seus sonhares em vida – alguns terão pesadelos,
podendo até achar estarem no inferno, outros terão sonhos belos, e jurarão
estar no céu – mas ambas serão apenas prisioneiras de suas lembranças e estarão
consumidas em mais ou menos tempo. A decomposição energética talvez acontecerá
antes mesmo da decomposição dos restos mortais...
A vida como
exercício de um ser integral é a vida de exercício do ser mortal e do ser
imortal. Precisamos zelar sim de nosso templo de vida, o ser mortal. Mas zelar
pelo ser imortal é consolidar uma meta energética em si, é permitir e abrir-se
a todas as experiências perceptivas com a luz da consciência. Escrevo este
texto colocando consciência em todas as palavras, por isso sentem o impacto
energético que quero transmitir, imprimir consciência em cada ato é dotar de
consciência o ser imortal, entregar-se ao mecanicismo do ser mortal, as rotinas
e a inconsciência é entregar-se à dissolução final que um dia chegará. Não se
trata de investimento, mas de meta a se consolidar, de obrigação energética, de
busca universal pela evolução. A consciência começa nos atos do cotidiano e
impregnam a vida em cada ato, seja ele o mais banal ao mais complexo este é o
grande mistério, estar consciente, pois consciência é vida, não nos termos
racionais, mas no mais profundo dito místico transcendental (a palavra mais
bonita que achei para isso, kkk).
Voltamos de
onde saímos então, nos textos mais antigos, talvez este sonho tenha servido
para me relembrar de que o importante não é seguir rituais místicos, cantos
esotéricos, músicas new age, mas sim dotar e impregnar de consciência cada ato
de nosso cotidiano, ação que por si só nos guiará ao caminho do nascimento
pleno do ser integral, que está dentro de cada um de nós buscando a sua
maturidade para que, quando este corpo que o veste perecer, vir ele a (re)nascer,
agora com sua consciência individual de ser único e imortal.
No inicio do texto falastes das preocupações diarias. O Guerreiro deve livrar-se de sus pendencias por um motivo estratégico.É lá onde a forma humana busca primeiro naquele reservatório de memorias para nos atacar com pseudo-preocupações.
ResponderExcluirO Nagual falava que quando tivessemos que pensar ocupássemos nossa mente com assuntos da segunda atenção,é mais interessante. Adorei a palavra Transcendental também tem os momentos excelsiores.
Daeion 10:25
Devemo tomar consciencia de nossa luminosidade, é muito importante para alcançarmos o sonhar lucido, desperto. Lembram daquele passo o Harpista onde podemos tocar as fibras que saem do ponto da segunda atenção.
ResponderExcluirDárion
Já tive aviao deste limite. Quando se olha num aquario vemos uma pelicula que separa os meios, o ar do aquoso. Esse limite parece com aquela membrana separando nos setotaol da terceira atenção.
ResponderExcluirEl Viento, lendo seu texto, me veio espontaneamente a questão: O que fez você considerar aquele ser especial? Mas fiquei também curioso, (não sei porque fiquei): Este ser do sonho era um desdobramento de alguém do seu cotidiano, ou um ser de outra dimensão?
ResponderExcluirEra especial porque tudo é especial, tudo é uma espécie de um gênero que chama energia...
ExcluirTalvez tenhamos que deixar de ser garrafa e nos tornamos gelo imerso no oceano. derretendo lentamente, até a total fusão com o todo.
ResponderExcluirA única coisa certa é que todos deixarão, alguns dissolverão em um instante, outros durarão mais tempo, o que os diferenciará além do tempo?
ExcluirNo sábado dia (06/09) intentei entrar em contato com o Nagual.
ResponderExcluir- Há muito tempo você vem praticando este Passo e agora merece uma explicação. Este Passo é um poderoso e misterioso não-fazer, muito antigo que permanece inalterado há milhares de anos e um dos mais completos sendo equivalente a uma série inteira.
Don Juan dizia que o Passo “El hombre que corre” prepara para a ação. Também se chama “agitação dos pés”. Desperta os pés, as panturrilhas e as glândulas supra-renais e agita nossos centros de vitalidade. Temos de estar sempre preparados para pegar o centímetro cúbico de oportunidade que o Espírito nos revela. Esse Passo dá ao praticante o estado de alerta necessário para tal, porque agita nossa franja de consciência e libera a energia presa na região dos pés. A franja da consciência começa a crescer a media que praticamos este passo. Além disso, trabalha com nossa memória sinestésica e pode ser usado como pré-aquecimento para a Recapitulação. Uma coisa interessante é que ao praticarmos esse Passo, nos intervalos entre a seqüência podemos ter estranhos acontecimentos ou visões. Está impregnado do Intento dos Antigos videntes.
- Eu adorava correr até ter uma contusão nos joelhos. Correr danifica nossos joelhos e a coluna. Você não precisa correr pisando no chão. Vou lhe mostrar um passo que meu próprio corpo energético me mostrou. Se posicione deitado e eleve as pernas e comece a fazer os mesmos movimentos das pernas como se estivesse correndo no ar...
Palavras...
ResponderExcluirSe você morrer antes de morrer você não morre quando morrer
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