O caminho de olhos abertos
Vejo a cada dia
mais pessoas clamando pelo seu fim, pelo sua morte, desejosas do dia de amanhã.
Nas conversas no trabalho, e em todos os cantos, sempre pessoas desejam que
chegue logo o amanhã – as vezes a noite, o final de semana, as próximas férias
-, todas demonstram muito cansaço e tédio por seus dias. Peguei-me a
questionar-me acerca das escolhas feitas por cada uma destas pessoas. Cada uma
delas foi conduzida até onde está por meio de escolhas, de bifurcações em seus
caminhos que as levaram, inevitavelmente, ao lugar em que se encontram hoje.
Cabe saber, nesta caminhada que trouxe cada uma delas até onde estão, se as
escolhas foram conscientemente feitas por cada uma delas, e até se foram feitas
as escolhas por elas, ou se foram apenas guiadas roboticamente até o local onde
hoje se encontram.
Na literatura
metafísica que temos, seja new age, seja xamanica, seja mágica, temos em comum
aquilo que se chama lenda pessoal, caminho do coração, e tantos outros
adjetivos que representam, em essência, uma caminhada plena guiada de acordo
com as aspirações pessoais, habilidades e peculiaridades típicas do conjunto
energético do ser.
Preliminarmente
devemos recordar que cada um de nós somos um emaranhado de filamentos
energéticos que carregam uma história, que carregam energia que já teve
consciência, e que pertenceu a outros seres antes da aglomeração no ser que
somos hoje. Alguns filamentos outrora foram pessoas, plantas, bichos, planetas,
estrelas, buracos negros, inorgânicos -, todos desfeitos um dia pela força
inexorável da dissolução chamada morte, e reagrupadas em novos seres pela força
chamada vida. Na analogia bem criada de Nuvem que Passa, somos como tapetes
fiados com infinitos fios de energia que foram infinitos tapetes diferentes no
passado. A primeira compreensão que devemos ter, portanto, é que não obstante
todos sejamos aparentemente iguais, pois partilhamos do mesmo molde de forma
neste presente no qual nos encontramos, somos essencialmente diferentes em
nossa composição, carregando o passado energético de cada parte de nosso todo
que reside dentro de nós.
O mistério
maior a ser descoberto, o mistério possível, somos nós mesmos, esta a primeira
jornada.
Mergulhar em si
é espreitar todo o nosso conjunto energético, em cada detalhe, perceber de onde
cada um veio, e perscrutar a consciência que foi guardada ali. Consciência é
como energia, não se perde, se transforma. Quando em meditação visões surgem,
quando você começa a ter percepções de outros mundos e outras vivências que não
suas, o que você está acessando, na verdade, é o conhecimento guardado em
determinados filamentos energéticos de sua composição, vidas passadas, não
suas, mas de pedaços que compõem a sua totalidade hoje. Eis um dos mistérios
não entendidos pelo espiritismo e outras doutrinas que apregoam a reencarnação,
de que não se mantém uma coesão do ego, chamado alma. Que o que acontece, na
verdade, é a fragmentação de nosso ser energético com a morte, a quebra de
nossa totalidade em milhares de fragmentos, de filamentos energéticos, que
levarão a nossa consciência e memória consigo, e serão reconstituído em outros
seres que serão aglutinados pela força criadora da vida. Alguns filamentos
carregarão uma impressão mais forte de nosso ser total, são aqueles filamentos
que se impregnam com a nossa consciência com maior força por conta da pressão
do ponto de aglutinação, outros levarão apenas lampejos de nossa consciência,
pois a maioria das pessoas deixa filamentos inutilizados dentro de seu ser
total, e não mantém a sua memória energética depois da morte. Devemos entender,
que a única forma de manter a coesão energética é por meio do ato magistral de
queima do fogo interior, que é, sinteticamente, livrar-se do molde humano, da
carne, queimando em consciência todos os filamentos, criando uma coesão interna
de consciência, que nos transformará em um ser inorgânico com a existência não
infinita, mas estendida por um tempo que não podemos ainda conceber, um tipo de
evolução, de renascimento que nos permite postergar a morte pela mudança de
forma.
Pois bem,
recapitular é o caminho inicial, é como aprender a nadar no mar de memória da
consciência. Iniciamos por navegar por dentro de nossas lembranças desta vida,
e à medida que seguimos mais fundo conseguimos, em profundas meditações,
acessar o que os espíritas chamam de “outras vidas”, não é o que fomos em outro
momento, mas sim o que parte de nós viveu. Entender isso nos permite entender
as memórias energéticas passadas que nos compõe e nos fortalece ou enfraquece
no presente. É conhecer-se profundamente, para além da história pessoal, é
conhecer a memória cósmica de nossos filamentos. Para conhecimento, é pela
afinidade entre a memória de filamentos, ou pela discórdia entre eles, que
gostamos ou não gostamos de alguém, no que chamamos de afinidades. Quando temos
conjuntos energéticos afins a outra pessoa, temos uma afinidade com ela, uma
ressonância, como se as memórias de um ser reconhecesse sua parte igual em
outro. Recapitular então é um ato de rememoração da própria vida, e olha só, se
não se conhece nesta pequena jornada, imagine se conhecer-se-á na grande
jornada que o precedeu? Por isso temos que mergulhar em nós mesmos, e após, no
ato mais profundo de recapitulação, no ato verdadeiramente mágico, mergulhar na
consciência passada de nosso ser eterno, nas consciências de todos os
filamentos dentro de si, isso nos fará cada vez mais plenos de consciência,
permito-me a dizer ao leitor, que conforme me foi mostrado, resgatar a
consciência cósmica dos filamentos dentro de nós permite dedilhar a biblioteca
cósmica, e isso permite fazer brilhar a consciência de filamentos desconhecidos
dentro de nós. Cabe a mim dizer que, iluminado um filamento quando acendida a
sua memória cósmica, ele atrairá, com seu brilho, o ponto de aglutinação,
permitindo uma imersão em mundos, e visões de mundo onde aquele ser esteve. Não
se assunte, conhecimentos indizíveis podem brotar deste ato mágico,
inimagináveis mas totalmente possíveis, bastando para isso afinco e dedicação.
Como se percebe,
este mistério que somos nós, reflexo perfeito do universo, composição única da memória
cósmica que nunca se perde, é um trabalho a ser feito por toda uma vida. É
importante ressaltar que as memórias mais profundas e densas que encontrarmos
nos levará a conhecer a nossa composição dominante, e responder questões como:
por que somos assim? Quais as minhas tendências? Quais as minhas habilidades?
Quais as minhas dificuldades? Essas respostas levam ao autoconhecimento
profundo, e demonstram como, por questão do destino ou de algo incompreensível,
podemos conhecer a nossa lenda pessoal, o nosso caminho do coração, aquele
destino que nos apraz, que nos deixa plenos em seguir, que não nos faz querer
abreviar o nosso tempo de vida, que nos faz querer viver cada dia plenamente e
não esperar e desejar que o futuro chegue de forma rápida e breve. Querer que o
futuro chegue é como querer com afinco a própria morte.
Conhecer-se no
que nos compõe permite conhecer a nossa lenda, e assim seguir o caminho do
coração, permitindo a imersão profunda no agora, no presente, estendendo a
nossa vida por meio da consciência, da atenção plena no agora.
Voltamos então
a questão inicial: as pessoas, em sua maioria, desejosas do futuro, que tipo de
escolhas fizeram em suas jornadas? Como escolher o que lhe preenche se
conhecer-se profundamente?
Percebemos, com
uma observação superficial, que as pessoas sequer conhecem os seus corpos
físicos, as sensações físicas do que são, menos ainda a sua mente, e quase nada
o seu conjunto interno energético. Sem saber do que são, não sabem o que lhes
apraz, não sabem para onde vão, nem sequer como vão. São apenas guiadas,
levadas pelo vento, como folhas em sua breve jornada desde o galho de onde
caíram até o chão em que jazerão. Desconhecendo o galho de onde vieram, não
sabem a árvore que os gerou, não conhecem da semente que fez tudo brotar, não
sabem da terra de onde germinaram, não sabem de tudo que os cercou. Não sabem,
portanto, o ciclo mágico que os fez vir da terra e voltar à ela. Não sabem seu
destino e como poder seguir esta senda da melhor forma possível, sem querer e
chamar a morte que se aproxima.
Se o primeiro
passo for cumprido, ou melhor, se for iniciada a jornada do autoconhecimento, a
pessoa conhecerá uma parcela de si mesma, e assim conseguirá determinar as suas
escolhas de acordo com o que é, com sua composição, com as suas
características. Assim, saberá reconhecer o uni, e poderá entender o verso. Entender
o verso é a atenção plena voltada para fora, é sentir como o mundo e tudo que
nos cerca nos afeta, e sabendo disso estamos explorando uma parte essencial de
nossa composição, a união do uni ao verso, a forma como o nosso atual conjunto
energético reage ao mundo que nos cerca. Este exercício é chamado de atenção
plena, é agir de forma consciente, atenta, focada, como os exercícios budistas.
Contudo, na totalidade deste exercício, é necessária a consciência tudo que nos
cerca, não só no mundo desperto, mas também no mundo do sonhar. No sonhar é
essencial que cultivemos também a atenção plena, consolidando assim todo o
ciclo de consciência necessária para a vida plena.
Desta forma
conseguimos, quiçá, sermos o objetivo do universo manifesto, de preservação da
memória do universo e cultivo da atenção na manifestação viva do próprio
universo. Ser em plenitude é entender a memória cósmica, é entender o presente,
as relações energéticas, as vivências e ligações de nossa energia nesta
caminhada. O caminho do ser que busca a sua plenitude é o caminho da atenção em
tudo que há, é um caminho de olhos abertos, um caminho desperto, toda e qualquer
caminhada que não tenha como centro a manutenção da atenção, é uma jornada de
desperdício energético, antinatural, de pecado energético, já que desperdiça a
função mágica que temos como observadores e navegadores de nós mesmos. Ser
impecável é ser consciente, e da consciência brota todo o restante.
"Assim, saberá reconhecer o uni, e poderá entender o verso." Gratidão!
ResponderExcluirIrmão, não consigo colocar em palavras como seus textos, especialmente esse ,falam com meu espírito. Venho praticado o caminho Taoista e estudando o caminho do Guerreiro em conjunto. Gratidão demais pelos ensinamentos da sua jornada.
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