A comunhão de nossa totalidade



O ser humano, bem como todas as coisas no Universo, é um emaranhado de imensa complexidade. Tentemos, com a nossa mente linear e cartesiana, catalogar tudo de forma um tanto quanto binária e reducionista, como se as existências fossem excludentes, binárias, maniqueístas. Tudo tende a ser catalogado como uma visão do certo e o errado, e são divididos desta forma por alguma maneira. O mundo se tornou esta redução de todas as coisas, uma simplificação das complexidades existentes. Em nós a todo tempo sinto tais influências e fluências.
Eu caminhava, outrora, ainda tateando, um pouco mais apenas preso ao véu da ilusão que nos cerca a todos, mas agora consigo ver mais uma fiação de verdade em meio ao véu que nos cerca. Estive com a companheira ayahuasca, estive dentro daquela força e, por um instante como são as iluminações, vi algo que me revirou do avesso em minhas convicções. Antes, em um certo tempo, eu ainda pensava em aspectos isolados de nós mesmos, naquela sina da pureza, da integridade de pedaços de minha complexidade e da exclusão de outros.
Por um tempo eu achava exatamente isso, que deveria matar pedações de mim em detrimento do que eu achava puro. Durante um tempo eu acreditei que o bom era o corpo físico, e então eu era apenas a edificação do ser externo, material, físico. Em uma outra época me dediquei, e com isso acreditei, que o ser intelectual era o ideal a ser perseguido, abandonando assim o ser físico. Depois pensei ser o ser ideal o objeto de minha busca e caminhada, e assim segui aquela trilha. Teve também o tempo de buscar o ser social, aquele de bares, festas, corpo aparente, e por esta senda andei da mesma forma.
Mas não via que de alguma forma, escolhendo pedaços como preferidos, eu excluía sempre a minha maior parte. O resto era a maior parte, o resto era eu, tal e qual a parte escolhida também era. Nenhum caminho poderia ser seguido por muito tempo com integridade, com totalidade, pois eram apenas fragmentos de mim lutando pelo foco de minha atenção, enquanto parte lutava para sobreviver. Eu lutava contra mim mesmo a todo tempo, o meu ser interior estava em guerra constante, quando aparentemente havia paz.
Geralmente as pessoas são assim, não gostam e não conseguem, pela formação que tivemos, buscar a integridade, a totalidade, mas apenas aspectos de si. Vestem-se com partes e a tomam como o todo, e sem reconhecer-se na totalidade, aos poucos matam-se, afogam-se iludidos de que são apenas aquilo que escolheram e que pareceu ser, naquele determinado momento, a melhor parte de si mesmos. Mas somos mais, muito mais.
Vejo tantos ao meu redor, e principalmente vejo-os como espelho de mim mesmo, a venderem a parte que melhor lhes agrada dentro de si, ou a que mais se adequa ao grupo que desejam pertencer. Se encontram o que acha ser o bem dentro de si querem logo matar o mal, mal sabendo que um e outro são apenas as bordas, os extremos de si mesmo, e que focando nestes extremos esquecem tudo que compõe a sua totalidade, olhando para um lado viram as costas para o outro, e para um mar infinito de complexidade entre ambos, uma ponde de travessia que deve ser percorrida, antes que consigamos, tendo asas, ver por cima de tudo que está tão próximo e desconhecido em nós.
Somos bons e maus, somos sombra e luz, somos sim e não, e tantos talvezes no meio disso tudo. Somos um umbral entre a sombra e luz, de diferentes tonalidades, cheio de tantas cores. Se somos espírito isso não impede que exercitemos o nosso corpo físico, que usemos a nossa mente, que foquemos na razão, que nos entreguemos a emoção, que sejamos o tesão do sexo e da criação, e que nos entreguemos também ao despertar da morte. Tudo convive na completude dentro de nós, essa é a busca, a comunhão de tudo que temos guardado dentro do que somos, o infinito manifesto no UM.

Só assim conseguimos, quiçá um dia, queimar no fogo interior, que é uma fogueira da iluminação de todas as partes que temos, que é a consciência de tudo que temos dentro de nós, que é a aceitação e o reconhecimento deste emaranhado infinito de ser, um breve hiato em meio a eternidade que nos é possível vivenciar.

Comentários

  1. Se me és o infinito manifesto no UM, sou em ti. Intento a todos!

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  2. Sintonia fina!

    HáBraços de zAion

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    Respostas
    1. Esse guerreiro está sumido, ou melhor, eu estou, ou melhor, estamos em outro âmbito de comunicação mas em sintonia sempre...

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