Para além do véu da ilusão



O comportamento em sociedade é um conjunto de ajustamentos do comportamento individual original, ditado energeticamente pela forma humana, para adequar-se aos padrões estabelecidos por grupos e instituições sociais. Desde muito cedo existem professores que apeiam o ser humano puro para que ele se molde às expectativas sociais. Trata-se de um conjunto de estratégias que visam cercar o campo ilimitado de possibilidades humanas em um conjunto limitadíssimo de possibilidades, dentro de um escopo pré-definido de escolhas socialmente aceitas. Logo cedo, em casa, se podam as primeiras penas das asas energéticas das possibilidades cognitivas humanas, por meio de estímulos positivos e negativos mostra-se o que é o “correto” e o “incorreto” sob a perspectiva social – não coma isso, não vista aquilo, não fale o que pensa, fale o que agrada, não se porte para se satisfazer, não acredite em sonhos, não acredite em visões, etc... Trata-se da estimulação primeira para a construção da fachada social mais interna, a fachada familiar, como será a pessoa e como se comportará, fachada esta que o ser energético tenta derrubar ou alterar na etapa conhecida como adolescência. Tudo, absolutamente tudo, é reduzido a um conjunto limitado do que é esperado para uma pessoa em um determinado grupo social, são erguidas várias fachadas sociais para diferentes círculos sociais, e qualquer coisa que fuja ao esperado é considerado um desvio, uma doença, uma desfuncionalidade, tão somente por não estar catalogado nas etiquetas do aceito socialmente e tidas dentro das cadeias produtivas da sociedade, não que sejam produtivas para o aprimoramento humano, mas sim produtivas para a manutenção da forma de vida humana, não falo aqui na produtividade do capitalismo, sob a ótica marxista, mas sim na produtividade energética para seres muito mais sofisticados do que os detentores dos meios de produção.
Uma das essencialidades do molde social, ou das fachadas sociais esperadas, é a constante necessidade de agradar ao que é almejado em cada situação social vivida. Se a pessoa está em uma mesa de jantar, por exemplo, as expectativas são de que a pessoa saiba usar os talheres, coma menos do que deseja, de forma comedida, não arrote, não fale com boca cheia, não critique a comida, ainda que esteja ruim, etc. Um conjunto de comportamentos são esperados, e a pessoa é condicionada a reprimir tudo o que realmente sente para se adequar ao que os outros esperam, que é ao final apenas um reflexo do que é esperado pelo sistema, pela programação social. Assim é na igreja, nos círculos de amigos, em casa, na casa de parentes, em datas festivas, etc. Fugir ao socialmente determinado leva a uma catalogação específica: sujeito disfuncional -, podendo esta desfuncionalidade ser mais ampliada ou mais reduzida, a depender dos efeitos, e ter consequências diversas, desde as terapias, passando por fármacos e até a segregação em hospitais psiquiátricos. Isso perpassa por uma constante repressão do viver para si e conhecer a si, para um viver para o outro e conhecer as regras do sistema, e não me confundam, não falo em viver para o outro em uma fraternidade iluminista utópica, mas sim viver pelas expectativas do outro, que ao final são reflexos pálidos das expectativas do próprio sistema, reflexos de uma ordem central de normatização social. 
Aos poucos, passo a passo na caminhada rumo ao envelhecimento (não confundir com o que deveria ser amadurecimento), jorros gigantescos de energia são entregues à construção de inúmeras fachadas perfeitamente adequadas aos ditames sociais. A construção das fachadas é uma forma de construir pontos de dreno energéticos constantes, que permitem que a energia para o amadurecimento, para o aprimoramento do que somos como conglomerados energéticos, sirva tão somente a manutenção de um sistema artificial, que tem por detrás de si a alimentação de quem está por detrás do cenário posto. Imaginem o que é gasto para a manutenção de fachadas que atendam as expectativas mais diversas, máscaras por sobre máscaras para atender as mais diversas artificialidades criadas, e o pior, as máscaras criadas desde muito cedo são tidas pelas pessoas como aspectos delas mesmas, partes de si, e ao não entenderem que são apenas fantasias em um mundo ilusório tornam-se, as máscaras, as próprias prisões dentro das quais está presa e constantemente açoitada a verdadeira natureza, a verdadeira forma humana, em contraste a forjada e monótona forma social.
Contudo, há outras consequências sobre as quais gostaria de falar. A manutenção de um sistema exige energia, como dito, mas exige também um deslocamento da atenção. Enquanto o viver para o aprimoramento do conglomerado energético pessoal, como seres percebedores, exige um caminho para dentro, para o autoconhecimento, o aprimoramento do sistema social exige um caminho para fora, e o pior de tudo, para um conjunto de regras e instituições vazias, ilusórias. Seria como passar uma vida tentando decifrar uma miragem, e seguir os ditames dados por esta miragem. As pessoas, como consequência dos mestres e sistemas sociais, começam a viver uma vida para fora, aonde importam as aparências ilusórias das coisas, importa o que espera o outro, e importa esperar algo do outro e das coisas ilusórias que as cercam. A vida se torna um conjunto de expectativas sobre coisas e pessoas, que leva a uma vida de desejos (positivos e negativos), e frustrações, consequentemente ao eterno sofrimento e dreno energético. Um misto de querer satisfazer e querer ser satisfeito, aonde algozes são também prisioneiros, ambos acorrentados pela construção social ao seu redor, sem sequer que saibam de suas prisões, tal e qual a colher que não sabe a sopa que carrega.
Lembro-me de uma passagem em que o velho Nagual expunha ao seu discípulo que todo lugar era exatamente igual, e que ao final não importava de todo aonde estivermos, pois tudo é exatamente a mesma coisa sob formas diferentes, vivemos nas emanações, não fazendo diferença se estamos na capital da França ou no rincão mais interiorano do Brasil, tudo é exatamente igual, e a jornada que fazemos é exatamente a mesma, concomitante a todos os seres do agora, todos com o mesmo objetivo:  a razão da existência de todos os seres sencientes é o desenvolvimento da consciência.
Olhando ao redor, e conversando com pessoas de meus ciclos sociais, observando redes sociais, comentários em sites, etc, vejo como uníssono na manifestação de seus mais sinceros desejos de final de ano que a grande maioria não queriam estar ali aonde estão, que queriam ter alguma coisa que não tem, ou deixar de ter outras, inundadas de desejos que as afastam do agora, do momento, da mágica constante e perene do agora. Miragens postas à frente das pessoas, na ilusão temporal, as afastam daquele momento representativo em que poderiam abraçar o infinito e reconhecer-se como parte do milagre, e assim, entendendo-o ver, e vendo, compreender a maravilha de ser e estar neste exato momento, para além de condicionamentos, fachadas, expectativas, desejos....
Quiçá esta tenha sido uma das mais magníficas realizações dos guerreiros novos, que por meio dos ensinamentos da espreita entenderam que podem viver a vida social, viver os ditames do pacto, mantendo a consciência que a fachada é apenas um reboco de gesso por sobre o concreto do real, o energético que é perene, e suplantar todo o condicionamento sem chamar para si a atenção e a catalogação de que são disfuncionais ou loucos. Os verdadeiros guerreiros videntes, guiados pela espreita, não são nada além do que pessoas comuns para a visão das pessoas que os cercam, absolutamente funcionais, passando despercebidos gerações por gerações, pairando por sobre tudo que se diz “normal” vivendo as suas lendas e seus ditames de expansão da consciência cósmica, como observadores imparciais. São médicos, juízes, malabaristas, andarilhos, investidores da bolsa, cartomantes, professores, advogados, delegados, policiais, eruditos, esportistas, enfim, são tudo que se pode ser, mas sabem que isso é apenas uma superfície irreal, cálida frente a maravilha do universo, vivendo a ilusão desta vida como uma dádiva que em breve se findará, e fortalecendo os músculos energéticos para a jornada que está para chegar. Sem desejar esperam, sem descansar caminham, sem arquejar pelejam, sabendo que deverão passar por todos os ciclos antes de seguir, sempre atentos para a hora em que a chance mínima surgir.
Não há diferença de onde se está, de qual máscara se usa, de qual personagem está interpretando, ciente de tudo o vidente olha ao redor e regozija-se sempre, pois para além da aparente concretude do mundo social, para além do véu ilusório, paira o universo energético: perene, constante, imutável -, em um jorro de energia que é a própria eternidade. 
Olhando daqui, de onde estou, vejo a eternidade do brilho sem luz em meio a escuridão infinita de brilho, olhando vejo o milagre que somos, todos nós, eu que escrevo, vocês que leem, e todos os demais que sequer se apercebem das vidas que os cercam. Olhando ao redor, para além da ilusão, vejo para onde devemos seguir, a eternidade está aqui, está ai, nos abraçando para além dos infinitos mundos, das infinitas percepções, e como me estimula a energia saber que podemos surfar por este infinito e que o que a Águia quer de nós é apenas que sejamos estes exploradores e nada mais...
Do vislumbre do infinito vejo a mim mesmo, olhando para fora vejo dentro, do brilho da águia vejo meu próprio lampejo energético, minha energia pulsar, e é para lá, para além do véu de Maia, que todos iremos navegar. Só temos uma escolha ante ao inevitável navegar: estaremos conscientes ou inconscientes neste infinito mar?

Comentários

  1. Se me és a eternidade do brilho sem luz em meio a escuridão infinita de brilho, SOU EM TI.
    Intento!

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  2. Nada tem importância. Pergunte a morte.

    L.C

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