No caminho de conhecer-se encontra-se a verdade

A jornada de todos que aqui estão talvez possa resumir-se a apenas um algo, um tom especial que às vezes saibam as vezes não. Todos buscam alguma forma de conhecimento, o homem desde a sua mais tenra infância busca o conhecer, ora com admiração, ora com medo, mas sempre tende ao conhecer. A criança que busca tocar o mundo, experimentar os gostos, regozijando-se com tudo que encontra é o exemplo mais simples deste querer conhecer, que parece em nossa espécie ir além das buscas dos outros seres orgânicos que aqui estão conosco. Olhando ao redor e observando vemos os animais, todos, em busca de alimentar aos seus instintos, alimentar-se, defender-se, manterem-se seguros, procriar-se em uma busca ao atendimento dos instintos que residem em todos estes seres. Mas o homem, diferentemente de todos estes, busca ir além, sendo que parece que a sua força motriz está em outro algo que não apenas os instintos de sobrevivência da espécie, e de perpetuação dos genes na Terra. Não é incomum, aliás, parece ser até uma conditio sine qua non que o homem arrisque-se em sua própria existência impelido por esta curiosidade de saber, de conhecer, de dividir e difundir o conhecimento. Tenho por certo que muitas vezes o conhecimento é tido aqui como poder, e tem assim seu valor aquinhoado como tantas outras coisas, mas este não é o ponto central. Em diversos mitos antigos, o homem sempre arriscou-se a ir além na busca de conhecer, como no antigo fogo roubado dos deuses. Conhecer parece a nossa mola mestra.

Importante então definir o que nos impulsiona na vida, e o que deve-se conhecer. A busca por engrandecer a nossa consciência tem um início, o nosso nascimento. Nascemos e somos impelidos por uma força desconhecida a buscar o conhecimento de todas as formas. Todos que tem a possibilidade de conviver com uma criança, ou já o tiveram, sabem da quantidade de porquês que se guarda dentro de um corpo tão pequeno. Os porquês são as sondas que as crianças lançam ao desconhecido, buscando engrandecer a sua consciência. É como se isso fosse um alimento de um saber especial, mágico, que dá um prazer ímpar a cada criança em seu desenvolvimento. No decorrer da vida outras coisas que surgem emperram esta busca, como a busca pelos desígnios da vida social, são desvios, barreiras que de certa forma são necessárias para o crescimento. Mas não é deste tema que falaremos aqui.

O homem difere sim de todos os outros animais por esta sede de conhecer, de fazer com que a nossa parte consciente apodere-se do desconhecido transformando-o em conhecido, ampliando o universo do ser, pois ser é conhecer. Esta é a força do crescimento do conhecido avançando por sobre o desconhecido e o transformando. Assim é a própria história da humanidade que se repete na vida individual de cada um. No decorrer de nossa história moderna construímos o conhecimento avançando por sobre o desconhecido, que por vezes nos causava o temos, por vezes a admiração. O mundo pequeno do conhecimento ocidental, guardado nas estreitas fronteiras da Europa alargou-se com as jornadas de guerreiros de seus tempos, à sua maneira explorando lugares distantes, avançando sobre a crença cega e os mitos antigos, derrubando o desconhecido e alargando o mundo conhecido. Assim as fronteiras romperam-se. Não tratar-se-á aqui dos efeitos deletérios do avanço e imposição de uma cultura sobre as outras, tudo foi um jogo energético, o poder do conhecimento avançou sobre as mitologias, destruiu o hermético e trouxe o conhecido, a secularização da razão foi por algum motivo mais forte do que o hermetismo e o conhecimento mágico. E algum ponto lá atrás em nossa história o poder da razão, e a secularização da razão e do conhecimento racional sobrepujaram o conhecimento silencioso, e isso fez com que nossa civilização fosse guiada para o que hoje vivemos. Se aqui estamos dialogando, utilizando de símbolos universalizados, é produto desta razão que avançou por sobre o desconhecido, e ainda o faz, interpretando-o em símbolos universais que são guardados para além de nosso interior. Houve um tempo por sobre a Terra em que o conhecimento era acessado por meio do poder do silêncio, por qualquer pessoa, um conhecimento que está ainda escrito nas linhas sem palavras da energia central do universo. Ainda hoje sentimos, cada vez com menos força, os insights, a premonição, a inspiração que está para além da abertura de manuais, e da consulta de conhecimentos que foram construídos com a participação de milhares de gerações que nos antecederam. Assim como houveram exploradores dos mares na época do mercantilismo, trazendo ao povo ocidental da Europa o conhecimento dos quatro cantos da Terra, também houveram exploradores do conhecimento silencioso que trouxeram conhecimentos antes inacessíveis para a grande maioria das pessoas. O que aconteceu quanto Einsten descobriu a relatividade em forma de símbolos matemáticos do e=mc²? Foi exatamente a codificação de um já conhecido postulado mágico antigo que era acessível apenas ao poder silencioso de feiticeiros, que diziam de desde tempos remotos que o mundo inteiro é composto de formas diferentes de energia aglutinada em campos perceptíveis de matéria. Assim foi com diversos pensadores, estudiosos. Fixando-se no centro exato da razão puderam vislumbrar o conhecimento existente no ponto exato do silêncio. Importante notar que o próprio Dom Juan nos dizia sobre isso, falando que apenas quem tem o ponto de percepção exatamente centrado no ponto do silêncio pode ver com clareza o ponto da razão, e da mesma forma o contrário. Neste simples enunciado está a fórmula mágica para muita coisa. Desta simples menção que pode nos passar despercebida descobrimos que o avanço da razão por sobre o conhecimento silencioso no mundo deu-se porque o centro da razão estava mais próximo do núcleo do conhecimento do que o centro do silêncio. Isso é explicado pelo próprio guerreiro  Nagual quando fala que os antigos estavam muito deslocados do convívio diário, quando ainda não tinham a prática da espreita como centro de suas atividades, e isso fez com que enfraquecessem-se. Buscavam entrar completamente no desconhecido relegando o conhecido a um descaso que lhes custou a vida, e a nós custou a curva que nos fez entrar na era da razão e sair da era do conhecimento silencioso. Apenas agora que começa o nosso ponto, aproximando-se do centro da razão, nos fazer como civilização a perceber o local do silêncio. Esta é a era da transformação que muito se fala, que traz o despertar de muitos. Como se fosse um jogo de brincadeira do Universo, chegando ao centro da razão fluiremos a uma era do conhecimento silencioso, ou um ponto além, é essa a evolução que devemos buscar, e não a crítica de como ou porque aqui chegamos em nossa jornada secular como seres de percepção do universo.

Voltando agora ao âmbito de cada um de nós, de nossa busca de crescimento, todos nascemos com uma propensão, como já dito, pela busca do conhecimento, mas nem sempre com as mesmas ferramentas para possibilitar essa busca. Uns gostam da palavra dita, e se desenvolverem essa habilidade serão grandes exploradores de histórias do universo, escritores de contos, narradores de histórias que, estejam certos, já existiram ou existem paralelamente no universo infinito da existência. Outros buscarão por meio da tecnologia dos símbolos numéricos o desconhecido, e permitiram explorarmos de outra forma o universo, conhecendo planetas, estrelas, ou imergindo no microuniverso da existência molecular de nosso mundo. Alguns outros tantos nos permitirão viajar com a música, nos deleitando no conhecimento das ondas acalentadoras das emoções. E assim, na composição única e especial de cada um, quando explorada a capacidade que temos, de forma impecável, possibilitamos que seja solidificado mais um tijolo no edifício do conhecimento que ergue há tempos a nossa raça humana. Desta forma o conhecer que cada um deve propor-se a fazer é o conhecer a si mesmo. Só quem conhece as suas características pessoais - as suas habilidades fortes e as suas características menos acentuadas -, pode desenvolver-se e ajudar no desenvolvimento da humanidade, de sua forma, na busca da evolução. O conhecimento deve fluir de alguma forma, e o universo utiliza da pluralidade energética para que possa o conhecimento manifestar-se das mais diversas maneiras. Não existe fórmula pronta para o conhecimento manifestar-se, ou para que a consciência se amplie, portanto é preciso conhecer-se. Não existe forma mais propícia de conhecer-se do que com a recapitulação, e conhecer-se é libertar-se.

Não existe maior prisão, e talvez não exista prisão que não seja o desconhecer-se, por isso é o efeito mais danoso da civilização moderna o nivelamento das pessoas por meio da mente social. Tenta-se, por meio das ferramentas sociais, nivelar a sociedade em padrões de comportamento, de agir, de produção do conhecimento, no despejar de expectativas nas pessoas para que se mantenha o status quo, mas isso descaracteriza a pluralidade que é de extrema necessidade para o desenvolvimento humano. A cada nascimento surge uma nova possibilidade de mudança em nosso mundo conhecido. Imagine de Mandela fosse tolhido a ser apenas mais um no sistema em que nasceu, Jesus, Gandhi, Budha? Imagine como seria o mundo sem a presença de Galileu, Einsten, Pitágoras? Imagine o mundo moderno sem as bestialidades que Hitle causou e que possibilitou que entrássemos em uma nova era de debates sobre os Direitos Humanos. A cada um é necessário ser fiel mais com a sua natureza, com as suas ferramentas internas do que com o mundo em que se vive. Da contestação do existir nos padrões definidos é que surgem novas formas de se ver o mundo, e destas novas formas em conflito com a visão tradicional, neste choque que se evolui a sociedade para um caminho que desconhecemos, mas que é guiado por uma força propulsora maior. O universo regozija-se na pluralidade de formas em que ele se vê e se expressa, na individualidade dos seres manifestos, e nós homens somos, neste reino terrenal de seres biológicos, a maior expressão da individualidade. Os animais podem, inobstante as pequenas diferenças, serem nivelados por um conjunto de ações mecânicas impelidas por seus instintos, mas nós somos impelidos internamente a uma diferenciação entre os outros, e impelidos pela máquina da mente social a uma nivelação, pois a mente social não gosta das mudanças e da evolução.

Somos então cada um, responsáveis pela evolução do universo, buscando utilizar a fórmula mágica dos antigos para um exercício magistral que chama-se conhecer-se. lembro-me de quando não me conhecia e que tudo era um medo sem fim. O medo rompe-se quando nos descobrimos, quando sabemos quem somos e quem não somos, quando estamos no caminho de saber-se. A consciência quando encontra o seu centro observador pode ver o mundo com uma clareza maior, com uma maior liberdade. Quando se fala em perder a forma humana, diz-se na verdade em perder a forma social da humanidade, a forma que condiciona todos a uma igualdade. Não que seremos identificáveis como diferentes, mas sim que olharemos o mundo com a lente mais cristalina da verdade interior. Isso não é ser melhor ou pior, é ser verdadeiro com a sua essência, é agir, como foi postulado aqui em comentário recente, e não reagir ao mundo. Conhecer-se é um caminho não muito difícil, mas um caminho pelo qual somos dissuadidos a caminhar. Somos ensinados quando crianças a respeitar regras, seguir padrões, sermos como outros, e com isso somos dissuadidos a sermos mentirosos e a mentira maior que há é consigo mesmo, desta mentira ninguém pode se libertar se não com a verdade.

Conhecer-se a si mesmo é conhecer a chave da libertação, e só assim é possível que se inicie a verdadeira caminhada pela vida. Olhe a sua própria vida hoje, por um instante, recapitule cada momento passado e veja onde está você no meio de todo entulho social que se postou entre você forjado pela mente social e você mesmo. Aos poucos se dispa destas mentiras, uma a uma e despindo-se se sentirá cada vez mais leve. Essa é a consciência que se busca, essa é a inconformidade que todos sentimos na vida quando nos deparamos com as mais diversas situações, não é possível ser feliz em uma vida de mentiras, onde as pessoas guiam-se por expectativas de outrem, por expectativas sociais, e não é possível a evolução da sociedade sem as diferenças. À medida que nos abrimos para a verdade interior de saber quem somos, nos abrimos à verdade exterior de não querer moldar ninguém a ser como nós, mas sim incentivar para que sejam como são. Não há maravilha maior do que as diferenças, e isso que nos faz sermos mágicos como somos. Vamos buscar ser, e sendo transcender!