Um presente de aniversário - o ato livre de agradecer
Hoje é o meu
aniversário, um dia muito especial para mim. Não por ser um dia em que as
pessoas ganham tapinhas nas costas, ou felicitações, pois isso em geral soa
mais cumprimento de dever do que verdade do coração. O dia é especial pois mais
um ciclo de vários se fecharam em minha vida, e só tenho o que agradecer ao
espírito por este dia. Há uma semana atrás, meus familiares, sentados
conversando sobre frugalidades, perguntavam-se sobre o presente que eu queria
ganhar nesta data, eu pensei, ponderei, e depois de muito pensar cheguei a uma
conclusão, que é o cerne do texto que hoje, nesta data, compartilho convosco
aqui neste espaço do infinito.
Naquele dia
especial, pensei por um instante em toda a minha vida, toda ela em suas
peculiaridades e em suas generalidades. Me vi nascendo, de pais felizes,
alegres. Meu nascimento veio de um amor de verão, meu pai de férias encontrou a
minha mãe, seus corpos estavam inundado de desejo, felizes, eles trocariam tudo
no mundo por aquele amor, o mundo era só os dois quando fui gerado. Fui gerado
de uma relação cheia de energia até as bordas, onde dois jovens apaixonados
fugiram de suas vidas solitárias para compartilhar uma vida a dois, e dali
nasci. Sou grato por eles me terem gerado no ápice de suas paixões, me deram
com esse ato mágico, mesmo sem consciência disso, um grande quinhão energético
de cada um, e isso me fez forte, este foi o primeiro presente do espírito, do
infinito para a minha vida, e este é o primeiro agradecimento que faço nesta
data. Se fosse pensar pelo meu nascimento, eu não pediria nada nesta data que é
hoje, pois nasci da melhor forma que poderia, de pessoas que se amavam, de
jovens apaixonados e cheio de sonhos. Participei do casamento deles ainda no
ventre de minha mãe, e fio amamentado com carinho desde o nascimento até poder
comer de outros alimentos. Meus pais deram parte de si para eu estar aqui, e
conversar convosco sobre esta data, dentre bilhões de espermas fora escolhido o
que me fez ser o que sou hoje, e não vejo motivo maior para agradecer hoje do
que essa possibilidade mínima dentre as possibilidades que me fez ser o que
sou.
Depois fui
criado neste mesmo berço, sem muitas regalias, sem muitas necessidades, uma
família normal, houveram dias de dor, dias de festa, houveram dias de fartura e
dias de dificuldade. Não me lembro de todos eles, muitos já foram queimados
pela luz da recapitulação, mas todos foram importantes para me fazer o que sou.
Como criança, sempre fui feliz com o que tinha, claro, desejava aqui e acolá coisa
ou outra que via nas vitrines, mas logo as esquecia e voltava ao que tinha. Eu
adorava a solidão em meus dias de criança, adorava estar sozinho em uma casa,
brincando, imaginado, sonhando, eu viajava por entre vários mundos, eu bem me
lembro, tinha amigos muitos que comigo conversavam em silêncio, de forma que
apenas eu ouvia. Não é com nostalgia que lembro destes dias, é com alegria
pura, eu era feliz como sou agora, com o que tinha, como sou com o que tenho.
Claro, queria me mover, mudar, evoluir, e ainda continuo a querer. Gostava
também de amigos, de brincadeiras, gostava das multidões e da solidão, e me
sentia bem tanto em uma como em outra. Os sonhos me perseguiam desde muito
jovem, me lembro de tantos e quantos pesadelos que tive em minha infância, os
sonhos eram tão reais, de forma diferente, pois hoje sei o que são, e antes
parecia apenas um mundo em que uma porta se abria para seres estranhos virem me
visitar. Eu era sonâmbulo, andava pela casa, pelas casas, conversava com
paredes, com televisões desligadas, abria portas, os seres parece que me
queriam levar com corpo e tudo para outro lugar, mas aqui fiquei, não era a
minha hora. Por este tempo, de muito jovem, só tenho o que agradecer, as boas e
as más lembranças, porque não, não tenho fantasmas de passado que me assombrem
hoje, só tenho amarguras que não me mataram mas me fortaleceram, e boas
lembranças que juntas as ruins edificaram o meu edifício do tonal. Então sou
grato por esta fase de minha vida. Como uma espada, nascida do aço duro, tive
que conviver com a dureza de dificuldades, e com momentos de candura, momentos
em que fui posto no fogo de provações, e momentos em que fui resfriado, e ainda
os momentos em que fui batido para conseguir o fio reto do que sou hoje.
Quando
adolescente sonhava em ir para longe de minha família, viver só, tentar a vida.
Desde muito cedo sonhei com isso. E assim se fez a minha vontade. Sempre
consegui o que queria, parecia algo mágico, por mais difícil que fosse, bastava
eu querer e as coisas faziam-se como mágica em minha vida. Nunca pensei em
futuros distantes, mas pensava nas necessidades do agora, e as tinha, sempre
foram fáceis as coisas para mim, e como não haveria de agradecer por tudo isso
que tive em minha breve vida até hoje. Viajei por muitas lugares, morei
distante de minha casa, minha casa já era o mundo. Experimentei drogas
diversas, viajei por doutrinas e religiões várias, era o tempo de entender o
mundo. Adolescente buscador, caminhando por entre vários caminhos. Um dia me
veio a mão um livro de Castaneda, eu o li, me apaixonei, senti que ali estava
meu caminho, mas não tinha ainda maturidade para segui-lo por completo, apenas
enamorei-me daquele conhecimento que viria a me resgatar em um futuro. Um tempo
de muito de tudo, em grande excessos, drogas, mulheres, festas, e tudo que
pensamos que é o único bom que a vida tem a oferecer. Eu precisava passar por
isso. Ali meu poder pessoal se esvaia, minha quantidade grande de energia ia se
gastando com coisas de momento, com as mulheres que eu queria, com tudo que eu
podia desejar, que magicamente sempre tornaram-se realidade para mim. Nunca fui
rico, ao contrário sempre tangenciei estados mais humildes, mas as coisas confluíam
para mim sempre, de forma mágica, e de certa forma trágica. Foi um tempo de
descobertas, longe de tudo, longe de onde eu nascera, sozinho no mundão grandão
que o é. Amor, paixão, festas, tudo era para mim um ão, menos gratidão. E o
caminho do guerreiro ficava ali, em segundo plano, evocado quando me interessado
e jogado de lado quando não convinha. Coisas da caminhada. Não tenho eu o que
reclamar deste tempo também, teria apenas a agradecer. Se não trilhei o caminho
reto de um sábio por não ter maturidade, trilhei o caminho de meus desejos e
impulsos, coisas da idade, coisas da vida, coisas da sociedade, o que me
importa por onde trilhei, se já foi, passou, não faço aqui uma crítica, mas
apenas agradeço aquele tempo, pois na minha loucura de desejos, ali eu tive
como sempre tudo que quis, apenas tenho então a agradecer.
Foi então
caminhando o caminho de volta as origens que me encontrei pagando o preço de
tanto gasto fútil de energia. Me voltei para perto de onde estavam meus pais,
estava já eu cansado da vida frívola dos desejos, queria aquietar-me. Voltar
aos estudos, quem sabe, voltar a buscar um sentido para a vida, meu coração
estava vazio, mesmo estando cheio de mulheres, amantes, amigos, festas
constantes, havia um grande vazio aqui dentro. Mas voltando percebi-me doente
dos excessos que tinha na vida. Senti-me esvaindo por entre as oscilações em
que vivia. Drogas, festas, bebidas, cigarros, mulheres, orgias, tudo cobrava o
seu preço e eu o sentia agora. Ensimesmado voltei-me para olhar para dentro. Não
via sentido mais nas buscas sem sentido, nunca havia visto mesmo, apenas me
deliciava no laissez-faire, que
me consumia toda a energia. Doente, trancafiado no meu quarto, não percebi que
passava por um estado de casulo, fechado. Mesmo doente, debilitado, desenganado
por médicos que diziam que minha saúde ia de mal a pior, o coração em
frangalhos por uma doença, o espírito mais uma vez, dentre tantas apenas me
dava oportunidades e presentes. Voltando-se mais uma vez ao conhecimento que
tocava meu coração, fui recapitulando a minha vida, medindo meus passos para o
passado, via as pegadas, e as apagava, pois a vida é assim, um constante morrer
e renascer. Entendi que trancafiado nas doenças do passado eu não poderia
seguir, que apenas recapitulando o passado poderia seguir em frente, e assim
foi. Recapitulei meticulosamente a minha vida pregressa, a morte sempre ao meu
lado, lembrada pelos tantos e quantos remédios receitados, e pela minha pressão
arterial sempre alta, e por minhas palpitações que me deixavam lembrar. A morte
estava ali, sempre me tocando, me acariciando, e como estava ali me deva
sobriedade. Foi um momento de realinhamento energético. A presença da grande
consorte me reanimou, a minha recapitulação me fez reerguer-me novamente,
energizado, e sair do casulo que tinha virado a minha vida. Existe força em
todos os lugares, o grande espírito me dava mais uma dádiva, a de ver que
chegando ao fundo do poço, podemos tomar impulso para subir novamente è superfície.
Esta fase de minha vida, doente que eu estava, apenas presentes eu ganhei, o
que parecia perdição era uma dádiva, um presente a mais entre tantos que recebi
em minha vida, e por este período tenho apenas a agradecer.
Então
em minha maturidade social, voltei-me aos estudos, homem dedicado, impecável em
seus atos, trabalhando, com uma família agora, estabilizado, o coração pleno,
realizado andando pelo caminho do meio, ciente do que é os extremos, comecei a
minha nova fase. Então o espírito me sorria mais uma dentre tantas vezes.
Seguindo firmemente o caminho me ergui no que sou, me descobri, encontrei uma
aliada de poder a ayahuasca, que muito me mostrou desde o primeiro encontro,
sobre mim, sobre o mundo, sobre o passado. O velho feiticeiros que me aparecia
nos sonhos de criança me voltou, Juan Cortez, o nagual, me ensinando, me
mostrando o caminho. Me senti forte, estou forte, pleno realizado, aparando as
lascas de minha energia bruta a cada dia, mas caminhando feliz e contente. E por esta fase de amadurecimento agradeço.
Como
no primeiro encontro com a ayahuasca, em que eu via um centauro atirando uma
flecha de luz para o céu, esta noite de hoje, de meu aniversário, sonhei comigo
sendo um centauro. Eu corria pelos campos, alegre, ciente da força que tinha e
da liberdade de correr com o vento, meu forte aliado. Eu era um cavalo, meio
homem, corria e senti caros amigos, a energia de cada um que conheço neste
mundo mágico, senti a energia de Dárion, de Jéssika, de Corsa, de Buca, de
Tori, de Puri, de Leo de Saulo, senti a energia de tantos que me desculpo se
não nominar algum aqui. Sentia energia dos anônimos que passam eventualmente e
colhem alguma mensagem deste espaço que lhes é útil, senti uma corrente de
energia boa, como se me felicitando por este dia, me emanando uma energia muito
boa. Neste sonho vi a Leoa Adaga, grande feiticeira e amiga, ela vinha e me
abraçava, parece que representava a energia de todos estes amigos da segunda
atenção, amigos energéticos, ela me agradecia por este espaço e pelas
mensagens, ela me agradecia por ser o mensageiro, e eu sorria a ela, alegre,
livre, desperto, eu apenas queria correr e agradecer ao mundo.
Então
volto agora como uma digressão ao começo do texto, na questão que me fez
pensar, sobre o que eu queria para este dia, o que eu quero. Não posso querer
nada amigos neste dia se não que tenho.
Eu não mudaria nada do meu passado, não trocaria uma pedra, pois o conjunto infinito
de eventos me levaram a ser o que sou, a conhecer quem conheço e a ser
agraciado pelo espírito como sou, o conjunto de batidas, de fogo de frio
forjaram a espada que hoje sou, e nenhuma batida pode ser trocada, e nem
desejaria eu que fosse, pois se isso acontecesse aqui eu não estaria. Tenho um
saldo positivo, já ganhei de mais, e ganho a cada dia, saúde, amor, felicidade,
belos desafios, belas vitórias para festejar, derrotas para pensar, tenho tudo
que pode ter um homem, e além disso tenho tudo que pode ter um feiticeiro.
Sinto o espírito ao meu redor, em tudo, em todos, sinto, o escuto, no cantar de
um pássaro, no brilhar do sol, na gota de um orvalho, no meu reflexo no
espelho. E o que eu pediria mais? Sou uma pessoa agraciada, abençoada, feliz e
plena, e não desejo nada além do que sou, e do caminho que trilho, desejar mais
seria egoísmo, e o ego não tem espaço no hoje, no agora que vos escrevo. Por
isso respondi aos meus familiares aquele dia. Não quero presentes, já tenho
tudo que preciso, se quiserem me dar algo material, juntem o dinheiro que iriam
me dar e doem a quem precisa, façam esse gesto, e ele por si será um presente
ao espírito, e como sou parte dele, será um presente para mim. Claro, não
entenderam, acharam ser um gesto de ingratidão de minha parte, mas não discuti,
não critiquei, apenas sorri e segui meu caminho, que me trouxe aqui.
Hoje
sou pleno, hoje existo, hoje sou consciente, hoje tenho tudo que preciso, e sei
disso, tudo que necessito para a minha caminhada. Hoje venho aqui mais uma vez
apenas para agradecer a cada um em particular e a todos como sendo apenas um,
agradecer a oportunidade única que tenho, que é esta vida, ao momento especial
que tenho, que é o agora, e a felicidade de ser, de estar e de poder tocar as
pessoas neste tempo em que estamos neste maravilhoso oásis que é a Terra.
A
todos os caminhantes que passam aqui, que não passam, ao universo como um todo, só tenho a dizer obrigado.
Luz,
paz, intento.
Me junto a ti em agradecimento, pela dádiva de mais esse dia, de estarmos vivos e nessa época maravilhosa.
ResponderExcluirSeu Hermano Dárion
IN Lak Ech Ala KIn
10:20 19/10/2012
* * *
Hermano, agora pouco chegava em casa, abri o portão e quando desci da moto um balão veio voando com o vento, um balão de festa de algum lugar. O vento me deu um presente, dizendo me felicitar pelo meu dia. Quer sincronia maior que essa, o balão era de cor âmbar só para completar. O espírito nos agracia a todo tempo com presentes, basta estarmos presentes.
ResponderExcluirLuz, paz, intento.
Hermano
ResponderExcluirnão estamos sós.
Dárion 11:52 19/10/2012
* * *
Que lindo relato, Vento!
ResponderExcluirEsses relatos de vida são sempre profundamente inspiradores pra mim, não sei quanto as outras pessoas... O aniversário tem mesmo uma magia só dele, que não dá pra explicar muito bem, mas que podemos muito bem sentir! Vamos comemorar, então! \o/
Forte Abraço!
Intento!
Felicidades Ênio!
ResponderExcluirQue seu presente seja o aprendizado constante!
abraço
que esse dia tenha sido um dia proveitoso e repleto de impecabilidade..e que na proxima vez que nossa mãe terra completar uma volta em torno do senhor sol sua jornada esteja mais clara e mais distante...força & coragem , no silêncio profundo..
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