Tropeços de um guerreiro: retornando ao fio da impecabilidade


Interessante, este desenho tinha sido soprado para mim, como inspiração de algo em meu próprio caminho, um paradigma na caminhada, mas eu mesmo não tinha percebido. Preocupado em repassar as mensagens, eu mesmo esquecera de escutá-las....

Por algum tempo pairei por sobre uma tentativa, que havia me sido demonstrada pelo espírito, ou pelo menos assim interpretada por mim, de me aprofundar em certas questões do lado direito, eu queria ir até o fundo disto, sou dado a esta mania, de entrar de cabeça em minhas buscas e ir até o fundo, ou até aonde o meu fôlego deixar.
Percebi, contudo, e com o tempo, que na verdade eu segui de forma diversa os presságios que me guiaram a isso, segui na contramão do fluxo de algo maior, um trabalho de consolidação entre as duas partes, e por algum motivo. Seria fácil para mim justificar tal dissidia de minha parte por meio de lacunosas explicações de que foram inorgânicos que queriam me ver longe do caminho, ou qualquer outro fato externo, mas o fato é que eu mesmo me joguei nesta cilada, e por algum motivo caí nela.
Na minha última postagem aqui, falei da questão da casamento, da união, no sentido realmente simbólico da dualidade que é existente em todos os momentos de nossa vida orgânica, desta nossa breve passagem por este plano maravilhoso, e isso foi realmente o cerne de minhas descobertas. Nascemos de um casamento mágico, uma união de duas bandas energéticas totalmente distintas, uma que nasce forte, e a outra que nasce fraca, uma selvagem e outra tímida e acanhada, e o cerne de tudo é descobrir equilibrar os dois lados, dar força ao lado fraco, domar o lado selvagem, entender o lado misterioso e sábio e ensinar ao lado inocente e vazio. Assim, à medida em que crescemos, ao longo de nossas vidas, tecemos a teia que deveria ser do equilíbrio, até um certo momento da plenitude energética, até que chegamos àquele ponto da dominação, da pedra no caminho, do verdadeiro desafio da domesticação humana, do arrebanhamento em um padrão que tende a querer superenfatizar um lado e recluir ao outro em uma cela escura para toda a vida. Se enfatiza um lado enquanto o outro é jogado em uma cela escura, e as chaves jogadas longe em um canto esquecido, dentro de cada um.
A nossa jornada, e falo nossa com a licença de acreditar que todos aqui partilhamos do mesmo caminho, é inversa, busca o resgate deste outro eu, desta parte que está dentro de nós esquecida, deliberadamente esquecida, pois é a parte que nos pode fazer fortes, que nos pode fazer deixar de ser um rebanho, ordenhado à cada dia, e que pode nos fazer libertos. A nossa chave, a chave para a continuidade de nossa caminhada evolutiva está ali, guardada nos conhecimentos ancestrais que esta parte tem dentro de si, e que são, em nossa grande maioria, relegados no esquecimento.
Fiz esta curva deliberada no texto exatamente para explicar a curva que eu próprio fiz em minha vida. Andando pautado pelo equilíbrio, em um tempo de um crescimento sem fim em minha vida, fiz-me acreditar por errôneas interpretações, que deveria mergulhar profundamente no mar do tonal, e deixar o nagual de lado, a me esperar a volta. Não o guardaria dentro de celas escuras dentro de mim, mas não o acessaria durante um tempo, era o que eu mesmo pensava, um caminho difícil, eu sabia, mas que eu tinha uma sensação ser necessário.
Não o era. Interpretações errôneas acontecem em nossas caminhadas, o espírito não erra em seus sinais, mas nós mesmos erramos em interpretá-los, este não é o verdadeiro ver, mas a decantação do ver pela mente ignorante, que volta ou outra intromete-se nas deliberações do espírito, não eventualmente para atrapalhar. Assim se fez com este guerreiro que vos fala. Neste jornada me fortaleci do outro lado, mas não quero falar disso, quero falar do lado em que me enfraqueci, do qual me distanciei, e hoje senti todo o baque disso em minha vida, de todo o tempo e toda a curva necessária para o entendimento de que nada se fortalece em apartado nesta nossa jornada, tudo é a dança de união das serpentes antagônicas, da roda do ying-yang, da dualidade que bem sabemos ser aparente, mas que é necessária para esta breve jornada que aqui fazemos.
Hoje estava eu caminhando em um mercado destes comuns a toda parte do mundo de hoje. Andando sentia-me já estranho, flutuando, caminhando por entre nuvens de algodão. Não conseguia manter-me atento aos pensamentos, que tanto me acompanharam estes dias de jornada unilateral. Estava em um delicioso silêncio de saber. Olhando para os lados percebi a primeira diferença. No local em que eu estava recluso, a afogar-me no mar do tonal, eu era cercado por uma vasta beleza, um lugar de ímpar cenário, mas eu não conseguia vê-lo. Afogado que estava em atribulações diárias, afogado em uma espreita sem sentido, ou que terá sentido um dia, eu senti naquele supermercado que a minha alma grande, o meu olho de grande visão, não o físico mas o olho de meu nagual, estava fechado para a vida, e por isso eu via tudo tão restrito, pequeno, fechado. Não via longe, não sentia as coisas com a visão, não tocava e acariciava o mundo, como costumava fazer com a comunhão das serpentes dentro de mim. Sim, eu estava enclausurado em uma pequena visão, a pequena visão do tonal, e não conseguia, por estar o nagual a dormir, ver o mundo além.
Neste momento, algo em mim explodiu, a visão ao meu redor mudou, as coisas todas tonalizaram-se com uma beleza incrível, aliás, crível para quem realmente vê, e lembrei, rememorei da forma que eu era, a visão clara que me acompanhava sempre, e a velocidade em que anda um homem ciente da beleza que é a própria vida. Não era o lugar em que eu estava de rara beleza, na verdade era de beleza mais do que comum, produtos, pessoas, luzes artificiais, mas era tudo cheio até a borda de vida. As linhas do mundo estavam ali, todas, em todos os lugares, eu me sentia grande, expandindo novamente, indo além da reclusão do corpo apenas, era tudo e podia tocar a tudo. As coisas pareciam mais lentas que o normal e eu queria andar lentamente pelos corredores, apreciar as pessoas, o ar, as linhas o infinito que estava ali, em todo lado, nas prateleiras, nas pessoas, em mim, dentro e fora ao mesmo tempo. Eu sorri e disse para mi mesmo que isso deveria ser o bocejar de meu nagual ao acordar novamente de seu sono, que eu mesmo me tinha imposto.
Que belo é despertar, e que triste é recluir-se em si. Os ditames sociais todos não precisam ser, nunca, enfatizados de forma a suplantar a maravilha de viver o mistério da vida. Os mistérios da vida, sob os olhos do nagual, não precisam nunca suplantar a organização necessária que o tonal nos dá na cosmovisão caótica do universo. O equilíbrio é a dádiva máxima a se alcançar, agindo dentro do mundo social com o olhar do mundo espiritual, equilibrando a maravilha de ser humano com o mistério insondável de ser humano, é a dicotomia e a luta sempre presente nesta vida, nagualizar o mundo social e tonalizar o mundo total, e agindo na balança o guerreiro, na tênue e fina linha da impecabilidade, segue pelo mais estreito dos caminhos que se pode imaginar, e neste fio de navalha, segue sorrindo, pois não há mundo mais belo, e desafio que seja maior presente do que é este em que vivemos.
Sim, estamos vivos, e não esqueçamos disso. Sim, somos mistério e não deixemos de buscar as respostas. Sim, somos homens, e não deixemos de viver como tal.
Neste momento, caros amigos, minha vida deu uma guinada. Misteriosamente estava esperando renascer aquele eu. Dizia, nas conversas com Kawak, que eu me sentia ainda fraco, e hoje o estalo aconteceu, eu realmente me reavivei, despertei, no momento em que esta mensagem eu escrevia, o mundo rodava e eu aqui parado ficava. O retorno do ponto de aglutinação é assim, minha totalidade voltou a uma realidade do eu forte, uma realidade de busca pelo mistério, e o espírito me acenou. Agora falando, não sei se mesmo este erro não foi deliberadamente posto em meu caminho pelo espírito, para que dele eu retirasse essa lição. A vida é uma bela jornada, e buscar deve ser a nossa meta constante, nunca devemos abandonar nem uma parte de nossa verdadeira natureza, nem uma parte do que compõe a nossa totalidade, abandonar uma parte de nós é desprezar o próprio presente que nos foi dado em nosso nascimento.
Hoje sei que há tempo para tudo, e nas 24 horas do dia do homem, há o dia e a noite, bem como deve haver sempre o tempo do nagual e do tonal dentro de cada dia de nossa caminhada.
Que este post seja em homenagem ao equilíbrio necessário, e que o equilíbrio seja a linha guia de nossas batalhas, e que estas sejam o prelúdio de nossa dança final de passagem para o próximo grande desafio de nossa infinita jornada energética.

Intento a todos.


Comentários

  1. Buenos dias Hermanos
    Sinto que essa tarefa de espreita pela qual passastes foi sim um dos ditames do Espirito, pois nada na vida de um Guerrero é por acaso. As armadilhas do Intento as vezes são necessárias para nos fazer acordar, sair de um ponto neutro, seguro, o que é uma ilusão. Nada neste mundo nos dá certezas ou garantias de nada. Na Natureza as vezes é preciso acontecer um cataclisma para uma renovação.
    Kawak 18/07/2014 08:10
    Seja mais uma vez bemvindo no retorno a casa.

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  2. Hermano o diagrama qu fizestes explica sem palavras o caminho. a jornada do Guerreiro muito bem.
    A divisão do tonal e do nagual e suas áreas de atuação.
    Mui grato mais uma vez.
    Kawak

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  3. "A roda do tempo!" Não há jornada errada, há experiências necessárias! Voltastes junto com o vento norte de ontem a noite e, ressurgistes com o vento Sudeste que sopra forte aqui no sul! Que bom que estás devolta Hermano Vento....saiba que a busca do equilíbrio também é algo por aqui!
    Intento
    Gaivota

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  4. Olá caros colegas! Realmente, o a inundação do nagual na vida cotidiana com o o equilíbrio de um tonal ágil, sóbrio e alegre é o nosso destino, nobre guerreiros! É fazer da vida, a magia com o P.A fluido, fazendo dessa realidade sua expressão mais bela.

    Realmente o espírito nos revela suas artimanhas. As vezes, em coisas banais, ele indica um fazer tolo, para, no momento da decisão e do ir fazer, ele mudar de indicação... Heheh. Faz isso só para testar o elo mesmo, é a mensagem que fica!

    Lembranças a todos colegas, agradeço pela companhia. Belo blog Ênio, aqui se reúnem os colegas que se dispersaram na comunidade finada, uma escola para todos.

    Até!

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    Respostas
    1. Olá caros colegas! Realmente, o a inundação do nagual na vida cotidiana com o o equilíbrio de um tonal ágil, sóbrio e alegre é o nosso destino, nobre guerreiros! É fazer da vida, a magia com o P.A fluido, fazendo dessa realidade sua expressão mais bela.

      Realmente o espírito nos revela suas artimanhas. As vezes, em coisas banais, ele indica um fazer tolo, para, no momento da decisão e do ir fazer, ele mudar de indicação... Heheh. Faz isso só para testar o elo mesmo, é a mensagem que fica!

      Lembranças a todos colegas, agradeço pela companhia. Belo blog Ênio, aqui se reúnem os colegas que se dispersaram na comunidade finada, uma escola para todos.

      Até!

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    2. Seja benvindo hermano Jorge
      Kawak

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  5. Hermanos Guerreiros Buenos dias
    partiu um grande homem: Ariano Suassuna autor do Alto da Compadecida, eloquente, bem humorado, viveu intensamente e cumpriu sua missão deixando um vasto legado de obras sobre nossa cultura.
    Kawak
    24/07/2014 07:58

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