O trabalho do fim de ano, o trabalho de toda vida






Um retorno para aquela que fora a fonte de muitas das grandes transformações em minha vida, desde o conhecimento e o gosto pelo caminho que hoje sido, o donjuanismo, até as transformações biológicas para a fase adulta. Um período de lembranças fora esse fim de ano, naquela casa antiga onde obtive o meu primeiro contato com o despertar em diversos aspectos, vi mais uma vez o quão é essencial em nossa vida a recapitulação. Foi um período de recuperação de energia para enfrentar o novo ciclo virtual em que vivemos, em mais uma ilusão dentre tantas outras. Naquela casa antiga, via lembranças percorrerem os corredores da casa, eram aspectos de um eu já passado, mas com uma carga energética ainda vida, não apenas uma carga de lembranças mas de energia viva, que ali vivia como um aspecto de mim mesmo, perdidas e desligadas da sua totalidade.
Ao chegar naquela casa antiga em que fui criada outrora, vi o ocaso de uma parte de minha jornada se formar. Lembranças todas se afloraram de um grande período de minha vida, de um período em que tudo se transformou. Me vi ali correndo como criança ainda pela casa, me vi e meus primeiros amigos de outro mundo ali, interagindo entre eles, como se sequer eu existisse, e senti dentro de mim mesmo o buraco que aquela energia fazia. Aquela casa parecia um emaranhado de teias de energia, como a toca de uma aranha, novelos embaralhados de energias não só minhas mas de tantos que nunca saberão porque nutrem lembranças e amores por aquela casa, mas que cegos seguirão até o fim de suas vidas alimentando esses espectros deles mesmos. Meu trabalho ali estava descrito com precisão pelo Espírito, ele sempre o grande jogador. Depois de longos dez anos sem ali estar senti ser a hora, e a hora foi marcada por reencontros e uma retomada do que sempre foi meu.
A casa passo que eu ali dava mais eu recuperava, como se eu reconduzisse a lá ao seu novelo, desfazendo tramas já compostas sem a minha consciência de histórias refeitas infinitamente e que, sem a consciência exata, eu nutria. Nos meses que precederam essa visita eu tinha tido sonhos desconexos entre si mas com uma linha de união: - todos aconteciam naquela cidade daquela casa. Eu andava pelas ruas, andava pelos jardins da casa, encontrava pessoas que ali estavam, vivia histórias já passadas, e sem saber o espírito já prenunciava o meu desafio, a recapitulação daquela etapa de minha jornada. Reencontrar locais e pessoas que marcaram etapas de seu passado é essencial em nossa jornada, e principalmente presentea-las pelo que fizeram em nossas vidas. Assim o fiz, como se fosse a última jornada, reencontrei todos os que me foram caros e a cada um deixei um presente, acoitado pela noite de natal que me favorecia, sem deixar marcas tudo passou como uma data normal, mas para mim apagavam-se as marcas e as pegadas de meu passado com o gesto ao infinito de romper os laços e presentear aos que me foram parte da jornada.
Recapitulando os eventos senti a minha energia crescer. Os sonhos se agigantaram em minhas noites de sono naquela cidade. Visitaram-me entes antigos, seres que há muito não viam, e me deram o recado claro: essa jornada de despedidas deve continuar. A cada respiração eu retomava aquelas energias que estava impregnada em cada canto da casa, a minha mente girava em um turbilhão, reflexo energético do que me estava sendo refeito. Tudo estava meio diferente no mundo, as coisas estavam mais completas. Como nosso corpo sonhador fica preso aos novelos de linhas energéticas não recapituladas. Se analisarmos todos os sonhos com profundidade teremos um mapa completo do que temos que recapitular em nossas vidas, e quando não recapitulamos com profundidade nosso corpo de sonhar fica preso a estas energias, estes emaranhados que são vórtices pessoais que aprisionam o nosso corpo de sonhar. Esta cidade, esta casa era um vórtice específico de energia muito forte de meu ser energético, e senti toda a profundidade do que haveria de recapitular naquele lugar.
A cada espectro de mim mesmo que eu via na casa, procedendo a respiração, conseguia reaver a energia, me sentindo mais leve, mais forte, mais livre. Via eu mesmo criança correndo para meu lado, me via ainda como adolescente, me via sorrindo, chorando, desejando, eu estava em todo canto daquela cidade, no centro, no clube, no parque, nas avenidas e na casa. Ouvindo, lendo, cantando, correndo, eram espectros de mim mesmo, eram partes de mim espalhadas. Olhando vi como ainda restam tantos pedaços em tantos lugares, com tantas pessoas e como o trabalho de recapitular ainda é profundo e intenso.
Ali naquela casa me recuperei em parte, mas quantas partes ainda não faltam para completar o todo? Quantas partes ainda cairão e se impregnarão em outros locais? Faço as seguintes indagações pois estando cheio de energia me possibilitei a ter diversos sonhares naquele local de poder. Em um deles me vi preso por alguns seres que se mascararam cmo antigos amigos meus de um outro tempo. Ali baixei a minha guarda e fui levado pela inconsciência chegando a um mundo abismal, estranho e pegajoso. Naquele sonhar me senti preso e rodando em vórtices que não tinham mais fim, sentia em meu estômago uma náusea sem fim, a minha voz do ver disse que eu estava preso em um dos vórtices mais fortes que já tinha enfrentado. Graças a energia que eu tinha recuperado naquela casa consegui, com muita força sair daquele mundo. Acordei imerso em uma poça de suor na minha cama. Meu estômago estava pesado e corri para vomitar no banheiro. Passei o dia fraco decorrente deste assalto, e isso me mostrou mais uma vez o perigo destes nossos vórtices que nossa própria inconsciência cria.
Nesta reflexão passei pela virada do ano. Recuperando parte de mim mesmo, de minha totalidade vi que a cada passo realizado sem consciência um pedaço diferente de nós mesmos fica no meio do caminho, impregnado em um sentimento, em uma pessoa, em um local ou até em um objeto. Vórtices que nos prendem, que nos sugam as energias são criados, seja em lembranças agradáveis seja em lembranças desagradáveis. Sejam em momentos bons ou ruins. Assim formamos espectros de nós mesmos que atraem o nosso corpo de sonhar para prisões de lembranças que afastam o verdadeiro sonhar de libertação que podemos ter para um sonhar de recordação, um sonhar de prisão nos porões das lembranças que formamos com pedaços de diversos locais por onde passamos.
A cada fim de ano temos que proceder exatamente desta forma: recapitulando os momentos passados e retomando os pedaços que deixamos cair no chão. Um trabalho árduo que temos é este, o de retomarmos o que é nosso ao mesmo tempo que liberamos o que não é – a energia de outros que fica impregnada em nosso campo de energia. Um olhar lançado para o próprio ano que se findou é necessário para seguir em frente, mas não um olhar analítico mas sim um olhar energético – recapitular.
O trabalho do guerreiro é reafirmado então não como uma promessa vazia de um bêbado na virada do ano, mas como um compromisso de toda uma vida.
De um lado o guerreiro livra-se de toda a bagagem desnecessária, devolve tudo que não é seu a sua fonte de origem, assim ele esvazia-se tornando-se leve para seguir a sua caminhada, essa é a primeira face da recapitulação – esvaziar-se de todo o desnecessário.
De outro lado o guerreiro reivindica tudo o que é seu não como ato de egoísmo mas sim como ato de cuidado com o presente maior que lhe foi dado em seu nascimento. O guerreiro sabe que em seu nascimento foi lhe dado o quinhão necessário, sem mais nem menos, para o prosseguir de sua jornada com perfeição por este mundo passagem. Desta forma o guerreiro reivindica o que deixou para traz em seus momentos de inconsciência, fraqueza, descuido, desatenção, assim ele enche e completa o seu vazio de si mesmo, e estando completo sente-se pleno, e a plenitude o dá forças para seguir a sua jornada e enfrentar os seus desafios, inteiro, podendo ter a chance de chegar ao final de sua vida e devolver o mesmo quinhão que recebeu inicialmente como moeda para uma nova etapa de sua jornada.
Não há nada mais importante e ao mesmo tempo mais difícil de se fazer com consciência e disciplina do que a recapitulação e proceder com ela é o ato mágico que a todos liberta, pois o guerreiro assim, reivindicando o que é seu liberta o que não é, tira com uma mão e dá com a outra, assume a sua liberdade de ser completo e ajuda na tarefa de outrem a sê-lo também, em um ato de equilíbrio perfeito e pleno, pois sabe que não pode carregar peso além do que lhe foi dado, e nem pode ter menos do que lhe foi concedido nesta pequena jornada mágica que é a nossa vida.
A todos neste novo ano um espaço para buscar o que é seu e devolver o que não é. A liberdade é uma via de mão dupla, só consegue ser livre quem permite que todos a sua volta também o sejam, só tem o que é seu aquele que não toma o que não é.

Intento guerreiros.

Comentários

  1. A todos neste novo ano um espaço para buscar o que é seu e devolver o que não é. A liberdade é uma via de mão dupla, só consegue ser livre quem permite que todos a sua volta também o sejam, só tem o que é seu aquele que não toma o que não é.

    Intento guerreiros. Cláudio Corrêa

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  2. Buenos dias Hermanos Guerreiros
    Realmente o que devemos fazer nesses fins de ano conturbados é fazer uma recapitulação mais profunda e nos prepararmos para novos conhecimentos.
    08:10 05/01/2015

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  3. Excelente texto, Vento que Sussurra! Intento!

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